Um debate às esquerdas com um ligeiro foco na direita: Foi assim o frente-a-frente de Inês Sousa Real (PAN) e Catarina Martins (BE), esta segunda-feira, na RTP3. A porta-voz do PAN acusou o Bloco de incentivar o crescimento da extrema direita e direita liberal, ao passo a bloquista não perdoa que o PAN se tenha aberto para coligar com PS ou PSD.
No que toca a medidas concretas, o BE abriu algum espaço a entendimentos com o PAN, nomeadamente no que respeita a acabar com benefícios ficais para indústrias ou empresas altamente poluentes. Por outro lado, e ainda no tema “impostos”, não há convergência possível em relação ao Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IRC):
“O IRC é um imposto que poucas empresas pagam sobre os lucros. Nós concentramo-nos muito na necessidade de aliviar a população portuguesa em impostos como o IVA da energia, que paga uma taxa de luxo e na verdade é um bem essencial. Precisamos também de aliviar quem vive do seu trabalho e ir buscar mais recursos onde ele está, porque o pagamento de impostos é muito desequilibrado em Portugal.”
“Quem vive do seu trabalho, da sua pensão, do seu salário, paga um imposto muito maior do que quem tem outro tipo de rendimentos. A nossa posição sobre o IRC é diferente. Nós fazemos uma distinção entre as empresas mais pequenas e as muito grandes empresas. Fazemos também uma distinção entre formas de atividade na taxação que queremos e, naturalmente, as atividade especulativas devem ser mais taxadas”, lembrou Catarina Martins.
No programa do Bloco de Esquerda para as eleições legislativas de 30 de janeiro, já consta a “criação de um novo escalão da derrama estadual para empresas com lucros entre 20 milhões e 35 milhões com a taxa de 7%”, um escalão que “permite um pequeno aumento do IRC das empresas com maiores lucros, que pode ser canalizado para o financiamento dos serviços públicos e da segurança social”.
Por sua vez, nas prioridades para as legislativas de 2022, o PAN defende um apoio às empresas, “reduzindo o IRC para 17% até 2026”.
Mesmo com posições distintas, será que Catarina Martins tem razão quando diz que o IRC é um “imposto que poucas empresas pagam sobre os lucros”? Os mais recentes números disponibilizados pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), relativos a 2019, respondem:
No triénio em análise (2017, 2018 e 2019), o número de declarações do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas entregues à AT registou um aumento significativo. Só em 2019, chegaram à AT 510 158 declarações, um crescimento de 3,5% face a 2018.
No que se respeita à distribuição das declarações por escalões de volume de negócios, a AT verificou que, no período de tributação de 2019, 86,8% das declarações se referem a contribuintes cujo volume de negócios é inferior a 500.000 euros. Do total de declarações entregues, apenas 0,4% dizem respeito a empresas com volume de negócios superior a 25 milhões de euros.
Relativamente ao número de declarações com e sem pagamento, a variável relevante para avaliar a declaração de Catarina Martins, no relatório da AT verifica-se que, “apesar de, no período de tributação de 2019, apenas 42,6% dos sujeitos passivos apresentarem IRC liquidado”, cerca de 60,5% dos sujeitos passivos efetuaram pagamentos de IRC por via de outras componentes positivas do imposto, “designadamente Tributações Autónomas, Derrama, Pagamento Especial por Conta (PEC), IRC de períodos de tributação anteriores (…)”.
Em 2019, apenas 0,8% das entidades efetuaram o Pagamento Especial por Conta, um valor baixo relativamente aos anos anteriores, que se prende com “o substancial alargamento das situações de dispensa deste pagamento previsto no atual quadro legal”.
De acordo com o quadro disponibilizado no relatório da AT, 39,5% das entidades que entregaram a declaração do IRC não ficaram sujeitas a pagamento, um aumento de 39,8% em relação ao ano anterior, em que apenas 29,3% dos contribuintes não pagaram o IRC.
Resumindo, são mais as empresas que pagam IRC do que aquelas que não pagam, segundo os dados mais recentes da AT. Este dado aumentou, aliás, significativamente no ano de 2019 (39,5%), não tendo no entanto ultrapassado a percentagem de entidades que estão sujeitas a esse pagamento (60,5%).
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Avaliação do Polígrafo: