O primeiro jornal português
de Fact-Checking

Carlos Guimarães Pinto contraria Mortágua: das despesas do Estado com a Segurança Social, só 6,4% vão para subsídio de doença, maternidade e desemprego?

Economia
O que está em causa?
Nas redes sociais, o deputado do Iniciativa Liberal decidiu rebater alguns dos argumentos proferidos por Mariana Mortágua no Parlamento acerca de impostos. Nesse sentido lembrou o exemplo do "João" que, dos 100 euros que a empresa lhe quis pagar a mais, só receberá 51 euros. Dos 49 euros que seguem para impostos (IRS e Segurança Social) será que só dois euros servem para pagar subsídio de desemprego, de doença ou de maternidade?

“Esclarecendo algumas confusões bloquistas sobre impostos”, escreveu o deputado liberal Carlos Guimarães num tweet – onde consta também um vídeo – partilhado a 28 de abril. Na gravação com menos de três minutos, intitulada “As confusões do BE sobre impostos em Portugal”, o liberal aponta que no debate de 24 de abril na Assembleia da República “a líder do BE teve algumas intervenções… interessantes”.

“A líder do BE foi confrontada com o caso de alguém que, ganhando 1.000 euros e o seu empregador tendo mais 100 euros para gastar com essa pessoa, no final do mês só recebe 51 euros“. Dito isto, Guimarães Pinto partilha a argumentação da bloquista, em que esta afirma que, dos “49 euros que o João paga ao Estado, uma parte vai para quando tiver filhos poder ter licença paga, para um subsídio de desemprego e para quando ficar doente”.

Mas será que essa “parte” de que fala Mortágua corresponde a “menos de dois euros”, como diz Carlos Guimarães Pinto?

Partindo do princípio de que, no aumento de 100 euros, estão já incluídos todos os gastos possíveis do empregador, então o aumento prático para o funcionário é de cerca de 80 euros. Deste montante, 19 euros seguem para a TSU, 9 euros são pagos pelo trabalhador à Segurança Social (28 euros de contribuições no total) e 21 euros seguem para o IRS, como se vê na simulação em baixo para um aumento no salário líquido.
 

Ora, segundo o indicador “Despesa da Segurança Social”, disponibilizado pela Pordata, da despesa total de 43.566 milhões de euros em 2022, apenas 1.592 milhões corresponderam a despesas por doença e maternidade e 1.276 milhões a prestações de desemprego. Contas feitas, estamos perante um total de 6,4%, o que resulta, das contas anteriores, num valor líquido de 1,79 euros (6,4% de 28 euros).

Resumindo, conclui Guimarães Pinto, “dos 49 euros entregues ao Estado, 1,80 euros vão para aquilo que é mencionado pela líder do BE, 13 euros para pagar as pensões atuais e o resto para outras despesas do Estado, incluindo outras despesas da Segurança Social”.

Porém, existe uma percentagem diferente se se tiver em conta as taxas contributivas (maternidade, doença e desemprego) que constam no artigo 51.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social. Estas somadas representam 7,31% do total global das despesas da Segurança Social, que são 34,75% no caso de trabalhadores por conta de outrem.

Ao Polígrafo, fonte do Bloco de Esquerda indicou que, com base nesta tabela contributiva, “o peso relativo destas três eventualidades no universo dos descontos é 20,51%. E, neste caso, o João descontaria 5,75 euros em 28 euros” e não os dois euros referidos pelo liberal.

Contactado pelo Polígrafo SIC, o economista Filipe Grilo confirma as contas de Carlos Guimarães Pinto e aponta que, “em teoria, faz sentido recorrer ao Código dos Regimes Contributivos porque o trabalhador tem direito a esta desagregação”, mas, na prática, “é mais correto olhar para os dados da Pordata porque a Segurança Social tem despesas de funcionamento que também têm que ser alimentadas pelas contribuições”.

Luís Leon concorda, mas considera que o deputado “não é rigoroso do ponto de vista técnico porque o trabalhador está a pagar uma contribuição – que funciona como um seguro – que acaba por ser para todos e não apenas para ele e pode ou não usufruir deste ‘seguro'”.

Apesar das diferentes interpretações, é matemático que, dos 49 euros que seguem para pagar IRS e Segurança Social, apenas dois euros – ou perto de seis se tivermos em conta o Código dos Regimes Contributivos – são efetivamente destacados para as despesas apresentadas por Mortágua. 

______________________________

Nota Editorial: Após publicação deste artigo, o Bloco de Esquerda esclareceu, em nota enviada ao Polígrafo pelas 19h10, que Carlos Guimarães Pinto “não se refere se o ordenado é bruto ou líquido”. Portanto, assumindo que se trata de um salário líquido, “os 28 euros são as contribuições para a Segurança Social, nove euros pagos pelo trabalhador e 19 euros pagos pelo empregador, que representam o total das contribuições devidas à SS – 34,75% no caso do trabalho por conta de outrem (11% por parte do trabalhador e 23,75% por parte do empregador)”.

Nesse caso, esclarece o partido que “quando se consideram as eventualidades de doença, parentalidade e desemprego, estas representam 7,31% em 34,75%”, logo, “o peso relativo destas três eventualidades no universo dos descontos é 20,51%. E, neste caso, o João descontaria 5,75 euros em 28 euros”.

“Mas as eventualidades não são só as descritas no exemplo. O João (e o seu empregador) descontam 28 euros para a SS, 11,72 euros para doença, parentalidade, desemprego, doença profissional, invalidez e morte e 16,28 euros para velhice”, conclui o partido.

A avaliação deste artigo não foi alterada tendo em conta a pergunta de partida, ainda que tenha sido acrescentada a explicação do partido liderado por Mariana Mortágua ao texto.

______________________________

Avaliação do Polígrafo:

Partilhe este artigo
Facebook
Twitter
WhatsApp
LinkedIn

Relacionados

Em destaque