“Isto é o turismo no Brasil, em Portugal toda gente tem porta aberta“, destaca-se numa publicação no Facebook em que se partilham as exigências da lei brasileira para a entrada de turistas no país.
“Turistas que desejam entrar no Brasil sem recursos financeiros para a estadia podem enfrentar dificuldades. A legislação brasileira exige que o viajante comprove meios de subsistência durante a viagem. Embora não haja uma exigência específica de valor mínimo de dinheiro em espécie, a apresentação de comprovativos de reserva de hospedagem, passagem de volta e recursos financeiros para cobrir as despesas é comum. Caso o turista não consiga comprovar esses meios, pode ter a entrada negada pela Polícia Federal”, lê-se.
Em causa estão as exigências para obtenção de vistos com fins de turismo. Mas será que em Portugal não é obrigatório nenhum dos requisitos mencionados?
Não.
Em Portugal, tal como em todo o Espaço Schengen, existem regras para a entrada e circulação de turistas. Contactada pelo Polígrafo, Lidiane Carvalho, advogada nas áreas de imigração e registo civil e sócia na FiO Legal, esclarece que o país segue as normas gerais da União Europeia e que os requisitos de entrada diferem para os cidadãos de Estados-Membros e para os vindos de países extra-comunitários – ou seja de fora da UE.
Uma das primeiras coisas a ter em consideração é a obrigatoriedade e a dispensa na obtenção de visto. Enquanto qualquer cidadão da UE tem acesso à livre circulação no Espaço Schengen, necessitando apenas do bilhete de identidade, os cidadãos de países terceiros – salvo exceções previstas num regime especial – precisam de pedir o “Visto Schengen”, também conhecido por visto de turista.
O Visto Schengen é uma autorização de entrada que permite aos cidadãos de países terceiros efetuar uma visita curta e temporária de 90 dias, no máximo, num período de 180 dias, a um país do espaço Schengen. Para se fazer um pedido deste visto é necessário apresentar o documento de viagem autêntico e válido por mais três meses para além da data de saída prevista, reserva de título de transporte de ida e volta, seguro médico de viagem e reserva de hotel (se aplicável), entre outros requisitos (Veja aqui).
No que toca à prova de meios de subsistência, explica Lidiane Carvalho, não existe nada escrito em lei: “É um juízo meio de razoabilidade, porque também dependendo de cada país da Europa é um custo.”
A UE tem atualmente em vigor um regime especial de inserção de vistos países com 61 países extra-comunitários, duas regiões administrativas especiais da China – Hong Kong e Macau – e uma autoridade territorial – Taiwan. Aplica-se o princípio da reciprocidade de vistos, o que significa que o mesmo regime de isenção de visto é aplicado a cidadãos da UE que viajem para esses países terceiros.
No entanto, importa ressalvar que a dispensa de visto não anula a obrigatoriedade de apresentação de documentos como o comprovativo de passagem de entrada e saída, hospedagem, meios financeiros de cobrir a estadia e o seguro de viagem.
Para Lidiane Carvalho, o mecanismo da manifestação de interesse pode ter alimentado a onda de desinformação das “portas abertas“.
“O regime da manifestação de interesse nunca significou que as pessoas entravam em Portugal sem nada. Isso é um absurdo. Há critérios e sempre houve. Muita gente sempre foi devolvida, porque não cumpria com as exigências. Chegava aqui como turista, não tinha informação, até com a intenção de ficar ou não. Conheço vários casos de pessoas que vinham realmente passear e não sabiam o que tinham que ter prova de hospedagem e foram mandadas de volta para o Brasil, não entraram”, aponta.
No caso do Brasil, para viagens de turismo aplica-se o visto de visita, que é concedido a turistas para estadias de até 90 dias, sem intenção de imigração ou trabalho remunerado. Entre os requisitos para a obtenção deste visto estão o comprovativo de meio de transporte de entrada e saída do território nacional, prova de meios de subsistência compatíveis com o prazo e com o objetivo da viagem pretendida e documentação que ateste a natureza das atividades que serão desenvolvidas no País.”
Mas mesmo para cidadãos de países com isenção de visto, devido ao princípio de reciprocidade, continuam a haver critérios para cumprir. Contactado pelo Polígrafo, o Consulado-Geral do Brasil em Lisboa esclareceu que “a isenção de vistos não assegura direito de entrada no Brasil, mas somente garante que o viajante poderá apresentar-se às autoridades de fronteira no Brasil sem a necessidade de tramitação prévia de um visto”.
“O controlo da entrada e permanência de estrangeiros no Brasil é feito pela Polícia Federal, nos termos da Lei nº 13.445/2017 e do Decreto nº 9.199/2017, que avalia, segundo os critérios pertinentes se o visitante poderá ingressar e permanecer em território nacional”, acrescentou a referida entidade.
Em suma, ambos os países exigem que os turistas cumpram requisitos para a sua entrada em território. A sugestão de que em Portugal “toda a gente tem a porta aberta” enquanto no Brasil tem que ser compridos diversos requisitos, ignora as regras que estão estabelecidas para a entrada de turistas no nosso país.
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Avaliação do Polígrafo: