O primeiro-ministro, António Costa, garantiu hoje que o Governo não hesitará em exercer as “competências próprias”, adotando outras medidas, caso a greve dos motoristas avance e os serviços mínimos fixados não sejam cumpridos. “Adotaremos as medidas necessárias“, frisou, no final da reunião de emergência de hoje, destinada a coordenar a resposta do Governo face aos efeitos da greve dos motoristas de matérias perigosas. “Estamos em condições de dar a resposta possível” em qualquer cenário, repetiu.
“Só avançaremos para passos subsequentes se, quando e na medida em que seja estritamente necessário”, ressalvou António Costa, esperando que “ainda seja possível ultrapassar o conflito”. Se tal não acontecer, “tudo está previsto para que, na hipótese de avançar a greve e não serem respeitados os serviços mínimos, o Estado tenha condições para assegurar a autoridade democrática e o cumprimento da lei“, asseverou.
Ou seja, o primeiro-ministro admite decretar a requisição civil no âmbito da greve dos motoristas. Aliás, ontem, apoiando-se no parecer pedido pelo Governo ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, o ministro do Trabalho, José Vieira da Silva, não excluiu a aplicação preventiva da requisição civil.
Perante a iminência dessa requisição civil, estão a propagar-se nas redes sociais múltiplas publicações lembrando que “o Bloco de Esquerda requereu com carácter de urgência a presença do ministro da Economia [no Parlamento] para dar explicações sobre a requisição civil decretada nos dias da greve da TAP“, em dezembro de 2014, quando estava em funções o Governo de coligação PSD/CDS-PP liderado por Pedro Passos Coelho.
A mensagem predominante de tais publicações consiste numa comparação entre o discurso do Bloco de Esquerda em 2014, relativamente à greve da TAP, e o discurso do Bloco de Esquerda em 2019, relativamente à greve dos motoristas. A líder dos bloquistas, Catarina Martins, referiu-se ontem a “algumas medidas exageradas” do Governo quanto à greve marcada para segunda-feira, dia 12 de agosto.
Mas confirma-se que o Bloco de Esquerda chamou ministro da Economia ao Parlamento quando o Governo de Passos Coelho decretou requisição civil na greve da TAP, em 2014? Verificação de factos.
As publicações em análise baseiam-se e remetem para um artigo publicado no portal “Esquerda.net“, do Bloco de Esquerda, no dia 18 de dezembro de 2014. “Requisição civil na TAP: Bloco chama Pires de Lima ao Parlamento”, destaca-se no título. “O Bloco de Esquerda requereu com carácter de urgência a presença do ministro da Economia para dar explicações sobre a requisição civil decretada nos dias da greve da TAP”.
“A decisão anunciada esta quinta-feira pelo Governo abrange cerca de 70% dos trabalhadores da TAP e todos os 1.141 voos programados para o período entre 27 e 30 de dezembro, altura em que foi marcada a greve contra a privatização da empresa por parte de doze sindicatos da transportadora aérea”, indica o artigo. “‘O direito à greve não pode ser subjugado à agenda política do Governo, mais empenhado em vender a TAP nas vésperas de acabar o seu mandato do que em fazer respeitar os direitos legais e constitucionais‘, diz a deputada Mariana Mortágua no requerimento”.
“‘Ao decretar a requisição civil, o que o Governo veio reconhecer é que a TAP não é uma empresa como as outras‘, afirmou a deputada bloquista, referindo que nunca foi decretada uma requisição civil numa empresa não estratégica. Para o Bloco, a conclusão é clara: ‘Isso prova a vitalidade da empresa para a economia e os perigos decorrentes da sua privatização‘”, acrescenta.
E depois conclui: “O requerimento diz ainda que a decisão do Governo ‘surge depois de dias de pressão intensa política e mediática sobre os trabalhadores, em que os grevistas foram acusados de tudo um pouco, nomeadamente de não acautelarem os supremos interesses do país‘. Mas para Mariana Mortágua, esta greve ‘não é para impedir os emigrantes de visitar o país no Natal, é para garantir precisamente que o poderão fazer no futuro‘”.
Em suma, a informação veiculada nas publicações em análise é verdadeira. Não obstante, importa salientar um elemento de contextualização: as críticas do Bloco de Esquerda em relação à requisição civil na greve da TAP, em 2014, abrangiam também a decisão do Governo de privatizar a companhia aérea portuguesa.
No mesmo dia 18 de dezembro de 2014, aliás, questionada pelos jornalistas sobre a requisição civil que o Governo pretendia impor nos dias da greve na TAP, Catarina Martins defendeu que “o direito à greve não pode ser subjugado pela agenda política de um Governo que está mais interessado em vender a TAP“.
“Quando o Governo decreta a requisição civil está a reconhecer que a TAP não é uma empresa como as outras, que é uma empresa estratégica que não pode parar em determinados dias. Mas se é assim, tem de reconhecer que a TAP não pode ser privatizada e deve ser pública”, sublinhou então Catarina Martins, dizendo esperar que o ministro António Pires de Lima pudesse esclarecer essa contradição no discurso do Governo quando fosse ao Parlamento, na sequência do requerimento do Bloco de Esquerda.
“O ministro tem de explicar como é que a TAP é tão especial que não pode parar em determinados dias quando aquilo que quer é vender a empresa e portanto deixar de defender qualquer interesse público. O ministro tem de explicar esta contradição“, defendeu Catarina Martins.
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