A 14 de setembro, o “Jornal de Notícias” noticiava que “os médicos no topo da carreira que aderirem à dedicação plena vão ter um aumento remuneratório de 1.521,07 euros brutos por mês, equivalente a 28,81%, dos quais 25% correspondem ao suplemento do novo regime, pago 14 vezes por ano e com efeitos nos cálculos para a reforma”. No “X” (antigo “Twitter”), a notícia foi replicada e até “corrigida”.
“1.500 euros que, rapados os impostos, são 750-800 euros limpos. No topo da carreira. A liberdade de um homem, no topo da carreira, com a responsabilidade e experiência acumuladas, por 1.500 euros brutos. E fazem disto notícia contando impressionar e inflamar a sociedade pobre que cultivaram”, destaca-se no “X”.
Na caixa de comentários, houve quem duvidasse do corte de cerca de 50% neste aumento: “Essas habilidades com os números, tiram razão à argumentação. Só podes estar a a aplicar a taxa de 48% de IRS que só se aplica à parte do rendimento que ultrapassam o 78.834 euros”; “Adoro essas contas dos 1500 euros ficam 750-800 limpos. Apresenta lá as contas para me rir um bocado.” Afinal, quem tem razão?
Começando pelo salário auferido por um médico no topo de carreira: de acordo com a tabela salarial de 2023 para os profissionais de saúde, divulgada pelo Sindicato de Médicos do Norte, médicos no topo de carreira ganham acima de 5 mil euros mensais.
Posto isto, a um salário-exemplo de 5.000 euros somam-se os 1.500 euros de aumento, o que perfaz um total de 6.500 euros brutos mensais, que por sua vez se refletem em 91.000 euros anuais.
Para ajudar às contas, o Polígrafo contactou Luís Leon, fiscalista e co-fundador da consultora Ilya, que começou por explicar que “o valor líquido decorre do efeito combinado do IRS e Segurança Social” e admitiu que seja “perfeitamente possível” que o valor líquido do aumento proposto pelo Governo acabe por rondar os 800 euros, como indica o “tweet”. Mas adverte: “Só não é linear porque a pessoa pode ser casada e o cônjuge não ter rendimento: a taxa de IRS é calculada pelo rendimento do casal”.
Pedro Pita Barros, especialista em Economia da Saúde e professor de economia na Nova School of Business Economics (SBE), explica ao Polígrafo que se o médico “ganhar 5 mil euros brutos por mês, multiplicando por 14 meses são 70.000 euros brutos por ano, sendo a taxa marginal de 45%”.
“Se tiver mais 1.500 brutos por ano, ou seja 6.500 brutos por mês, 91.000 por ano, coloca na taxa marginal de 48%, o que significa que fica com 52% líquidos dos 1.500 euros, o que dá 780 euros por cada 1.500 euros que ganhar”, esclarece Pita Barros.
Caso não houvesse a passagem de escalão de IRS, que aumenta de 45% para 48% a partir de um rendimento colectável de 78.834 euros, “os 1.500 euros brutos dariam origem a 820 euros líquidos”. Por isso, como conclui Pita Barros, “a resposta é sim, o aumento de 1.500 euros brutos por mês, em cima dos 5.000 euros brutos por mês de base, dá um aumento líquido de menos de 800 euros“.
Importa notar, no entanto, que este valor pode ser influenciado por factores como o estado civil e o número de dependentes a cargo e que, posteriormentte, parte do mesmo é devolvido aquando da entrega da declaração do IRS.
____________________________
Avaliação do Polígrafo: