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As máscaras descartáveis podem ser reutilizadas se arejarem durante alguns dias?

Coronavírus
Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
A possibilidade de se voltar a usar uma máscara descartável não é colocada de parte por especialistas. Mas defende-se que tal só deve ser feito em caso de necessidade e que, no atual momento da pandemia de covid-19 em Portugal, esse cenário não se coloca.

A diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, assumiu no dia 8 de julho que a utilização de máscaras ao ar livre, como medida de combate à propagação da Covid-19, poderá vir a tornar-se uma realidade em Portugal. “Não temos qualquer problema em expandir o uso de máscara, mas para isso é preciso sustentabilidade científica“, declarou em conferência de imprensa, após a divulgação dos dados epidemiológicos da Covid-19 no país.

A utilização de meios de equipamento de proteção individual em espaços fechados e transportes públicos – até agora a única determinação em vigor – foi recomendada pela Direção-Geral da Saúde (DGS) no dia 13 de abril. “Aplicando-se o princípio de precaução em Saúde Pública, é de considerar o uso de máscaras por todos as pessoas que permaneçam em espaços interiores fechados com múltiplas pessoas, como medida de proteção adicional ao distanciamento social, à higiene das mãos e etiqueta respiratória”, explicou a DGS através de um memorando.

Três meses depois, a utilização de máscaras – respiradores, cirúrgicas ou comunitárias – e as regras de correto manuseamento continuam a levantar novas questões. Uma delas está relacionada com a possibilidade de se usar mais do que uma vez uma mesma máscara cirúrgica descartável, desde que a mesma tenha ficado a arejar durante vários dias.

“As máscaras descartáveis podem reutilizar-se desde que se usem apenas durante umas horas, como é o caso da maior parte das pessoas”, assegura Mónica Berjón Otero, investigadora especializada em Virologia e Biologia Molecular no Instituto Max Planck de Investigação Médica, na cidade de Heidelberg, Alemanha, em declarações ao “Maldita.es”.

Na perspetiva do pneumologista Filipe Froes, questionado pelo Polígrafo, tal cenário só se deve colocar em caso de “escassez” de material de proteção individual. “Quando há escassez, temos legitimidade de procurar essas soluções. Neste momento, em Portugal, não faz sentido“, defende, embora admitindo que tal possa vir a acontecer numa segunda vaga da pandemia. Até lá, considera ser necessário validar estudos científicos sobre esta matéria.

Por sua vez, o infecciologista Tiago Marques também defende que a reutilização de uma máscara descartável “é um sentimento que apenas por necessidade tem de ser colocado”, apresentando “grandes problemas” que devem ser tidos em conta. A saber:

  1. “A persistência viral no exterior da máscara e que pode, embora com redução progressiva do numero de partículas virais activas, durar cerca de uma semana após a ultima exposição;
  2. A eventual danificação da máscara/filtros pelos procedimentos eventualmente utilizados numa tentativa de esterilização e que pode comprometer a eficácia desta numa próxima exposição ao novo coronavírus (SARS-CoV-2);
  3. A probabilidade de a máscara que se vai reutilizar conter partículas de SARS-CoV-2, ou seja, é diferente reutilizar a máscara que se usou para ir à padaria, para entrar numa ala de isolamento onde estão doentes confirmados ou estar num serviço de urgências”.

O mesmo especialista recorda que o tempo de uso de uma máscara reutilizável “não deve exceder” um período entre quatro a oito horas e que a mesma deve ser mudada caso se apresente húmida ou visivelmente contaminada.

Para Tiago Marques, as máscaras descartáveis podem ser reutilizadas caso estejam limpas e “não haja grande risco de exposição ao SARS-CoV-2″.

De forma a ser arejada, Tiago Marques explica que se deve colocar a máscara com a parte exterior virada para baixo, sobre uma superfície limpa. Ao recolocar, deve ter-se cuidado para nunca tocar na parte exterior do equipamento, possivelmente contaminada, com as mãos. Deve também evitar-se que essa parte da máscara toque na face da pessoa.

E existem métodos comprovados de esterilização de máscaras descartáveis? O infecciologista assume que “não” e que algumas tentativas de o fazer, “usando radiação ultravioleta e derivados de cloro ou de peróxido de hidrogénio”, podem danificar os filtros, comprometendo a “segurança do utilizador numa futura utilização da máscara”.

Por isso, com o objetivo de manter a segurança do equipamento de proteção individual, Tiago Marques aconselha que não se aplique qualquer substância química desinfectante na máscara ou se faça um tratamento pelo calor. Nem que se manipule a parte exterior da máscara sem desinfectar imediatamente as mãos, ou se partilhe a máscara com terceiros. Neste último caso, porque “a superfície interior passa a ser um foco de contaminação, no caso de algum dos utilizadores da máscara ser portador de SARS-CoV-2 ou de outro agente infeccioso”.

A possibilidade de reutilizar máscaras descartáveis – depois de arejarem durante alguns dias – é admitida pelos especialistas questionados pelo Polígrafo, embora ressalvando que só se justifica em caso de estrita necessidade. Os mesmos especialistas alertam para vários riscos inerentes a tal reutilização e subsequentes medidas de precaução que devem ser tomadas. Também apontam para a necessidade de validar estudos científicos sobre esta matéria.

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Avaliação do Polígrafo:

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