- O que está em causa?Líder do Chega esteve ontem à noite na SIC Notícias, onde delineou os objetivos para as eleições legislativas de 10 de março. Questionado sobre a libertação de todos os detidos da Operação Influencer, Ventura argumentou que tal não significa que "que os indícios não são fortes" e que "a regra hoje no processo penal português é ir para casa", ou seja, a libertação dos arguidos. Tem razão?

No dia em que ficou conhecida a decisão do juiz de instrução de libertar todos os cinco suspeitos detidos por ordem do Ministério Público - que vai recorrer das medidas de coação - no âmbito da Operação Influencer, o líder do Chega esteve na SIC Notícias para uma entrevista em que, além das eleições, falou sobre este e outros tópicos.
André Ventura frisou que "o facto de o juiz ter mandado as pessoas para casa não quer dizer que os indícios não são fortes". Ou seja: "Desde 2006 a regra não é a prisão preventiva, a regra é só haver prisão preventiva quando os outros [indícios] não são suficientes. O juiz pode considerar que os crimes de tráfico de influências e outros, mas sobretudo o tráfico de influência e o recebimento indevido de vantagem, estão suficientemente indiciados nos autos, mas mesmo assim aplicar uma caução."
O líder do Chega concluiu ainda que "as pessoas pensam que por ter ido para casa são inocentes, mas não. A regra hoje no processo penal português é ir para casa" e "só em casos muito excecionais é que se fica preso". Será assim?
Diz a Constituição da República Portuguesa, no segundo ponto do Artigo 28.º, que "a prisão preventiva tem natureza excecional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei".
No Código do Processo Penal (CPP), nas alíneas a) e c) do primeiro ponto do Artigo 202.º, define-se que o juiz pode impor ao arguido a prisão preventiva quando "houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos" e quando "houver fortes indícios de prática de crime doloso de terrorismo ou que corresponda a criminalidade altamente organizada punível com pena de prisão de máximo superior a três anos".
Para o advogado Paulo Veiga e Moura, o princípio mencionado por André Ventura "é verdadeiro", já que "só crimes que têm uma moldura penal acima de cinco anos poderão efetivamente ser objeto de prisão preventiva".
Ou seja, tendo em conta que os crimes mais gravosos caíram - corrupção e prevaricação - e estes sim apresentam uma moldura penal superior a cinco anos, sobraram crimes com moldura penal inferior de cinco anos (tráfico de influência e oferta indevida de vantagem), e, portanto, "mesmo que o juiz ache que não há outra alternativa para evitar o perigo de fuga, não poderia aplicar a prisão preventiva".
Assim, "teria que aplicar outras medidas de coação, tendentes a evitar este mesmo perigo de fuga". É precisamente nesse âmbito que Lacerda Machado tem, por exemplo, como medida de coação a obrigatoriedade de não se ausentar do país.
Nuno Cardoso, advogado da firma Telles, vai ao encontro do que afirma Veiga e Moura. Segundo o advogado, a aplicação das medidas de coação de prisão preventiva ou prisão domiciliária "depende da verificação de pressupostos legais que têm a ver com a moldura penal abstrata do tipo legal de crime em causa e, cumulativamente, com a verificação no caso concreto de um dos requisitos legais alternativos previstos no artigo 204.º do CPP". Além disso, esta só deve ser aplicada "quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coação para fazer face a tais perigos".
Nos casos em concreto, estão em causa o crime de tráfico de influência, que está previsto no artigo 335.º do CPP e "comporta diferentes modalidades, puníveis com diferentes molduras penais", e o crime de recebimento ou oferta indevidos de vantagem.
No primeiro crime imputado, a regra a ter em conta é a que está disposta na alínea c) do primeiro ponto do Artigo 202.º do CPP, uma vez que o crime de tráfico de influência pode corresponder a "criminalidade altamente organizada". Cardoso afirma que "uma vez que a aplicação da medida de coação de prisão preventiva exige a prática de crime punível com pena de prisão de máximo superior a três anos, no que se refere ao crime de tráfico de influência, tal medida de coação apenas será legalmente aplicável quando estiver em causa a conduta de solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para abusar da sua influência, junto de qualquer entidade pública, nacional ou estrangeira, com o fim de obter uma qualquer decisão ilícita favorável".
E, a somar a isto, caso se verifique "qualquer perigo de fuga, perigo de perturbação do inquérito, perigo de continuação da atividade criminosa ou perigo de perturbação da tranquilidade pública".
Já no que diz respeito ao recebimento ou oferta indevidos de vantagem, "uma vez que a moldura penal abstrata prevista para este tipo legal de crime não excede os cinco anos, não será aplicável ao agente de tal crime a medida de coação de prisão preventiva ou de obrigação de permanência na habitação (prisão domiciliária)".
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Avaliação do Polígrafo:
