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Agente da PSP impediu indevidamente filmagem de ação policial no bairro da Bela Vista em Setúbal?

Sociedade
Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
A interrupção forçada por um polícia da filmagem de uma rusga tornou-se viral no Instagram, exibindo o momento em que um agente da PSP desfere um safanão no telemóvel que estava a registar em vídeo a situação ocorrida no bairro da Bela Vista, em Setúbal. A polícia pode proibir filmagens na via pública, ou qualquer cidadão comum tem o direito de filmar uma intervenção policial em curso? O Polígrafo responde.

“Aqui está um exemplo de quando tentamos gravar para nossa segurança num bairro social ao sermos abordados pela polícia. Primeira coisa que o polícia que vem lançado faz é dar uma cabeçada. No segundo vídeo ouve-se o mesmo agente a continuar a agredir e a pedir para que a vítima desse de volta. Está aí, não preciso de adiantar mais”, lê-se na descrição do post de 18 de abril no Instagram.

A sequência de dois vídeos gravados através de telemóvel durante uma rusga policial, efetuada numa rua do bairro da Bela Vista, em Setúbal, foi visualizada e partilhada por milhares de pessoas, chegando também a outras redes sociais. O autor das filmagens é um jovem de 22 anos de idade, parte de um grupo de pessoas que estavam a ser revistadas.

Ao iniciar a gravação, retratando a operação em curso de agentes da Polícia de Segurança Pública (PSP), foi questionado por um dos agentes sobre o que estava a fazer e se tinha a certeza de que o podia fazer. Aparece depois um segundo agente que se dirige ao jovem e, entre impropérios, dá um safanão no telemóvel, para impedir a filmagem.

A polícia pode proibir filmagens na via pública, ou qualquer cidadão comum tem o direito de filmar uma intervenção policial em curso?

De acordo com a informação disponibilizada pelo Gabinete Jurídico da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), no Artigo 79.º (Direito à imagem) do Código Civil estipula-se, logo no primeiro ponto, que “o retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela”.

No segundo ponto estabelecem-se várias excepções relativamente a tal preceito: “Não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou de justiça, finalidades científicas, didácticas ou culturais, ou quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente”.

Estão a ser partilhados nas redes sociais dois vídeos, gravados no bairro da Cova da Moura, Amadora, nos quais surge um elemento da Polícia de Segurança Pública (PSP) a fazer uso do cassetete para mover e partir algumas garrafas de vidro espalhadas pelo chão. O registo videográfico é autêntico, mas a PSP e moradores do bairro - questionados pelo Polígrafo - divergem no propósito de tal ação policial.

Quer isto dizer que o agente da PSP podia impedir a realização daquela filmagem? A resposta é negativa. Há uma regra interna da PSP, orientada para aquele exato tipo de situações, que estipula que os agentes não podem impedir a gravação de imagens do seu trabalho.

A Diretiva 04-INSP-2014, intitulada como “Captação de imagens de pessoal e ações policiais”, aponta precisamente para o segundo ponto do supracitado Artigo 79.º do Código Civil, sublinhando que “não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente”.

Esta formulação, segundo a orientação interna a que o Polígrafo teve acesso, justifica que se considere que “não haverá qualquer prática lesiva dos direitos à imagem do elemento policial sempre que um cidadão proceda ao registo, vídeo ou fotográfico, de qualquer ocorrência, ou ação, quando a captação da figura do elemento policial se encontrar enquadrada na imagem de lugares públicos, de factos de interesse público ou de factos que decorram publicamente“.

A Diretiva, da autoria do então inspetor nacional Manuel Magina da Silva (atual diretor nacional da PSP), conclui que, pelo facto de a atividade policial se desenvolver maioritariamente na via pública, “não poderá haver a expectativa de absoluta salvaguarda do direito individual à imagem, não havendo assim legitimidade para concretizar qualquer intervenção no âmbito das medidas de polícia, somente pelo facto de um cidadão proceder ao registo de imagem da atividade policial“.

No mesmo documento refere-se ainda que “a captação exclusiva da imagem de um elemento policial desenquadrada de lugar e/ou acontecimentos públicos” pode constituir ilícito criminal, o que não foi o caso da filmagem sob análise.

Em suma, é verdade que o agente da PSP impediu indevidamente o jovem envolvido numa rusga de filmar essa operação policial.

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Avaliação do Polígrafo:

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