“A Ucrânia não existe como país. Na ONU continua como território russo, logo não existe invasão. (…) Em 04/07/2014, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, fez uma declaração impressionante, cuja distribuição nos media ucranianos e na Internet é proibida. O conflito entre os dois países foi discutido em reunião do Conselho de Segurança da ONU. A partir disso, foi tirada a seguinte conclusão: A Ucrânia não regista as suas fronteiras desde 25/12/1991. A ONU não registou as fronteiras da Ucrânia como um Estado soberano”, começa por expor a publicação no Facebook, de 11 de março.
O texto, que tem sido copiado e partilhado sem alterações por vários internautas, continua a explicação: “Portanto, pode-se supor que a Rússia não comete nenhuma violação de direitos em relação à Ucrânia. De acordo com o Tratado da CEI [Comunidade dos Estados Independentes], o território da Ucrânia é uma região administrativa da URSS. Portanto, ninguém pode ser acusado de separatismo e mudança forçada das fronteiras da Ucrânia. Sob a lei internacional, o país simplesmente não tem fronteiras oficialmente reconhecidas.”
“Na verdade, agora é suficiente para a Rússia declarar que este território é russo e que tudo o que acontece neste território é um assunto interno da Rússia. Qualquer intervenção será vista como uma medida contra a Rússia”, conclui o post.
Estes argumentos fazem sentido?
Vamos começar pelo início do texto. A 7 de abril de 2014, data referida na publicação sob análise, Ban Ki-moon esteve no Ruanda para assinalar duas décadas do genocídio que, em 100 dias, provocou 800 mil mortes. O discurso do então secretário-geral da ONU foi publicado no site oficial da organização e nunca é mencionada a Ucrânia.
Na altura, em 2014, a situação era tensa na região do Dombass, depois da anexação da Crimeia. Também a 7 de abril, numa entrevista coletiva ao porta-voz adjunto de Ban Ki-moon, em Nova Iorque, a Ucrânia é referida, mas nunca é mencionada a questão das fronteiras e da soberania do país: “O secretário-geral está profundamente preocupado com a crescente instabilidade no leste da Ucrânia no último fim de semana. Ele insta a todos aqueles que têm responsabilidade ou influência sobre a situação para diminuir as tensões e incentiva todas as partes a manifestarem-se pacificamente para aliviar a situação.”
Mais, ao contrário do que é referido no post, não houve reunião do Conselho de Segurança da ONU a 7 de abril de 2014, de acordo com o site oficial.
E quanto ao reconhecimento de fronteiras e a soberania da Ucrânia?
A resposta é simples. “As Nações Unidas não são um Estado nem um Governo e, portanto, não têm autoridade para reconhecer um Estado ou um Governo. Como organização de Estados independentes, pode admitir um novo Estado como membro ou aceitar as credenciais dos representantes de um novo Governo”, é possível ler no site da ONU.
Por outro lado, depois do referendo realizado a 1 de dezembro de 1991, em que mais de 90% da população ucraniana disse “sim” à independência, o então presidente russo, Boris Yeltsin, reconheceu essa independência logo no dia a seguir.
Uma semana depois, a 8 de dezembro, os líderes das três maiores repúblicas da URSS – Rússia, Ucrânia e Bielorrússia – assinaram o acordo que permitiu fundar a Comunidade dos Estados Independentes (CEI), apresentando-se como Estados soberanos. De acordo com o artigo 5º do tratado fundador da CEI, as partes “reconhecem e respeitam a integridade territorial de cada uma e a inviolabilidade das fronteiras existentes na Comunidade”.
Mais tarde, a 31 de maio de 1997, Boris Yeltsin e o então presidente ucraniano, Leonid Kuchma, assinaram um “Tratado de Amizade“e as fronteiras ucranianas foram novamente reconhecidas pela Rússia. Seis anos depois, a 28 de janeiro de 2003, a Rússia e a Ucrânia também assinaram um tratado sobre a fronteira comum entre os dois países e esse acordo bilateral seria registado nas Nações Unidas em 2016.
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Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking (verificação de factos) com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.
Na escala de avaliação do Facebook, este conteúdo é:
Falso: as principais alegações dos conteúdos são factualmente imprecisas; geralmente, esta opção corresponde às classificações “Falso” ou “Maioritariamente Falso” nos sites de verificadores de factos.
Na escala de avaliação do Polígrafo, este conteúdo é: