“Na Escola Secundária Amélia Rey Colaço, em Oeiras, o diretor da escola ingeriu no processo de eleição da Associação de Estudantes (AE)”, acusa a publicação divulgada ao final desta quarta-feira. “O diretor da escola tentou censurar o programa eleitoral de uma lista concorrente à AE, tentando dissuadi-la de realizar atividades que fomentam a educação sexual da escola”, acrescenta.
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Por estes motivos, o movimento exige “uma nova gestão democrática das escolas”, que deve contar com uma “direção colegial” e na qual não deve estar presente a “figura do diretor”. O movimento conta assegurar a “representação dos estudantes na direção e a eleição de todos os membros, sem a concentração de poderes numa só pessoa, como existe hoje”.
Na carta remetida aos estudantes que integram a lista candidata à AE, uma semana antes das eleições, a direção da Escola Secundária Amélia Rey de Colaço deixa claro que “a educação sexual é uma competência das famílias dos alunos, enquanto menores de idade e, mesmo perante alunos maiores de 18 anos, é uma matéria em que na nossa escola não interferimos”.
“Mesmo quando o tema aparece integrado no capítulo da Identidade de Género, na disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, a escola assume uma perspetiva conservadora, pelo que quaisquer iniciativas neste domínio não terão o apoio da escola nem poderão decorrer nas suas instalações“, ressalva Hernâni Pinho, que assina o documento.

Com votos de uma “boa campanha” e de “boa sorte para o dia das eleições”, a carta não foi bem recebida quando começou a circular na Internet, tendo sido entendida como um atentado à democracia sob a forma de censura. A “objeção de consciência” no que respeita a tópicos como a educação sexual tem sido utilizada como forma de afastar estes temas dos recintos escolares.
Também no caso dos alunos de Famalicão, que chumbaram por não terem frequentado a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, os pais alegaram que a educação para a cidadania é uma competência da família, sendo que há “especiais preocupação e repúdio” nos módulos “Educação para a igualdade de género” e “Educação para a saúde e sexualidade”.
Ao Polígrafo, no entanto, Hernâni Pinho, diretor da Escola Secundária em questão, contraria as acusações e afirma até que a escola sempre manteve uma “relação de excelência e de grande abertura e recetividade com as Associações de Estudantes”.
O problema está, esclarece, num dos pontos do Programa Eleitoral a que o Polígrafo teve acesso: a “reformulação da educação sexual“. A carta, que foi enviada no sentido de os alunos reverem este tópico, serviu para “explicar que a Escola entende que a parte da educação é uma competência das famílias. A Escola serve para instruir os alunos e para ajudar no processo educativo”.
“Em temas estruturantes, nomeadamente a Educação Sexual, até por respeito às famílias e porque diferentes famílias têm diferentes visões e opções e formas de lidar com o processo educativo, a escola não deve estar a fazer um discurso para os alunos todos. A nossa perspetiva a esse nível é de não interferir. A perspetiva conservadora vai exatamente nesse sentido”.
Hernâni Pinho ressalva que “chamou os alunos” e que fez essa recomendação, mas assegurando logo que a lista estava aceite e que iria participar do processo eleitoral. “Não houve aqui um processo de dizer: ‘Ou vocês reformulam isto ou a gente não aceita'”. Da parte dos alunos, acrescenta o diretor da escola, houve logo um esclarecimento de que não era intenção da lista “ir aos temas de fundo”, mas antes abordar situações como “violência no namoro e planeamento familiar”.
A abertura da escola a essa nova “intenção” dos alunos foi-lhes logo transmitida, conta ao Polígrafo Hernâni Pinho: “Aí têm todo o nosso apoio e nós achamos que são temas importantíssimos, que já abordamos nas aulas, mas que nunca são demais. Todo o reforço que [a lista] quiser fazer, tem o apoio da direção.”
No que respeita ao programa eleitoral, a reformulação do tópico foi feita, os alunos “aceitaram e concordaram que o título é um bocadinho impactante e podia dar para todas as interpretações“, informa ainda o diretor. As eleições na Escola Secundária Amélia Rey Colaço vão decorrer na próxima quarta-feira.
Guilherme Almeida, candidato à presidência da AE, diz ao Polígrafo que a “educação sexual nunca poderá ser vista como um tema a evitar”. “É importante olhar para os números alarmantes da violência do namoro, para o drama nacional que é a violência doméstica e entender que a Educação Sexual é uma das formas de combater esta triste realidade”, defende o estudante, que aponta para a necessidade de uma educação sexual “ampla, plena, inclusiva e feliz na busca de estudantes conscientes e informados”.
“São diversas as escolas onde os alunos são impedidos de se candidatar, onde os processos eleitorais, as campanhas e programas são marcados e condicionados pelas direções sem o conhecimento dos alunos. Numa época onde a democracia e a participação na mesma por parte dos cidadãos é tão proclamada pelos mais diversos setores da sociedade, torna-se incompreensível que na escola pública se dificulte a intervenção democrática dos estudantes e se desvalorizem eleições e o tão importante ato da discussão, participação e voto para os órgãos que os representam. Por isso, também exigimos que o Governo assuma responsabilidades e faça cumprir a lei”, conclui.
O Polígrafo contactou o Ministério da Educação sobre este caso, mas não obteve resposta até à publicação deste artigo.