A polémica sobre os tarifários de abastecimento de água e de saneamento no concelho de Paços de Ferreira levantou questões sobre as faturas e tarifas aplicadas também noutros municípios. Num artigo publicado anteriormente, o Polígrafo verificou que a aplicação de consumos mínimos é ilegal, segundo o artigo 8.º da Lei 23/96. Mas serão as taxas fixas – que aparecem na sua fatura – uma forma de cobrar consumos mínimos, “contornando a lei”?
Não, as tarifas fixas não são consumos mínimos. “A tarifa fixa – ou tarifa de disponibilidade – tem um objetivo muito específico, que não depende do consumo: cobrar alguns serviços de disponibilização ao consumidor, mesmo que ele não esteja a consumir”, explica ao Polígrafo Antonieta Duarte, especialista da Deco Proteste. “Por exemplo, no abastecimento da água: eu posso não consumir durante um mês, mas ao abrir a torneira tenho sempre acesso à água. O mesmo se aplica ao saneamento ou recolha de resíduos.”
“Esta tarifa visa cobrir parte dos custos que a entidade gestora tem pelo facto de disponibilizar os serviços e a pessoa pode usá-los quando quer”, prossegue Antonieta Duarte, sublinhando que “a partir do momento que existe um contrato, existe um valor de tarifa que está contratualizado e que tem de ser pago pelo consumidor”.
“Esta tarifa visa cobrir parte dos custos que a entidade gestora tem pelo facto de disponibilizar os serviços e a pessoa pode usá-los quando quer”.
Por outro lado, o consumo é medido pela entidade gestora e cobrado na tarifa variável. Essa sim, representa o valor que o utente utilizou durante o período a que a fatura diz respeito. Caso o cliente não utilize o serviço, este parâmetro deverá ser igual a zero. É importante frisar, no entanto, que os tarifários de água, saneamento ou recolha resíduos variam de município para município, não havendo uma harmonização a nível nacional do serviço.
Para não pagar as tarifas fixas, o serviço terá de ser interrompido. “Em determinados municípios, pode haver a possibilidade de a pessoa cancelar o contrato durante o tempo que não estiver e depois voltar a ativar o contrato. Isso é possível. Agora, não pagar tarifa fixa um mês e no mês seguinte sim, isso não pode ser porque existe um contrato que tem sempre um tarifário agregado. Esse tarifário é aplicado sempre que o serviço estiver ativo”, afirma a especialista. O ato de cancelar e retomar o serviço pode implicar custos aos utilizadores, pelo que deve informar-se junto da entidade gestora de abastecimento, saneamento e resíduos no seu município.
“Em determinados municípios, pode haver a possibilidade de a pessoa cancelar o contrato durante o tempo que não estiver e depois voltar a ativar o contrato. Isso é possível. Agora, não pagar tarifa fixa um mês e no mês seguinte sim, isso não pode ser porque existe um contrato que tem sempre um tarifário agregado”.
Afinal, quando estamos perante um consumo mínimo? “É considerado consumo mínimo se o consumidor não tiver um serviço ligado. Se for considerado uma tarifa fixa, que pague o serviço, não é um consumo mínimo”, responde a especialista da Deco Proteste, referindo que no caso de Paços de Ferreira “existe uma desproporção ao nível do valor”.
Contactada pelo Polígrafo, a Águas de Paços de Ferreira, uma empresa privada que tem a concessão do serviço no concelho, nega que estejam a ser cobrados serviços mínimos aos utentes. No entanto, remete para a autarquia a responsabilidade pelo tarifário atualmente em vigor: “A Águas de Paços de Ferreira é obrigada, por lei, a aplicar o tarifário que é determinado pela Câmara Municipal de Paços de Ferreira. É a autarquia que determina o tarifário e a concessionária aplica-o.”
Por sua vez, a Câmara Municipal de Paços de Ferreira (CMPF) informa que o tarifário foi proposto pela concessionária no âmbito de um processo negocial para a redução do custo de água em 50%, tendo sido posteriormente aprovado pela autarquia. Humberto Brito, presidente da CMPF, garante ao Polígrafo que os habitantes do concelho não têm de pagar se não consumiram, podendo contestar as faturas ou introduzir um caudalímetro – aparelho que mede o caudal – para contabilizar o saneamento usado.
“Quem propôs este tarifário foi a Águas de Paços de Ferreira, no âmbito de uma negociação para a redução do tarifário em 50%. Deu de um lado, impôs do outro. Quem não gastar água vai pagar saneamento, impôs-nos isso. E nós – não vou dizer que de forma errada – entendemos que havia pessoas com rede privada de água [poços ou furos artesianos] que deviam pagar saneamento. Mas isso atinge um conjunto de pequenos comércios que, efetivamente, não têm fontes alternativas de água a não ser a rede pública. Mas esses podem introduzir um caudalímetro e se não gastaram, efetivamente não pagar”, afirma Brito.